Mulheres têm só 20% dos empregos na Tecnologia e ganham 30% a menos. Por que e como mudar?

O setor de Tecnologia da Informação (TI) gera mais de 1,3 milhão de empregos no Brasil e, conforme dados da Softex, tem um déficit de mais de 48 mil profissionais que, se não for suprido, poderá ocasionar perdas de receita da ordem de R$ 115 bilhões até 2020.

Mesmo carente de mão de obra, este mercado ainda repele muitas candidatas a suprir tais vagas em aberto. Conforme a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio do IBGE, só 20% dos profissionais que atuam no mercado de TI são mulheres. Uma escassez que não é exclusividade nacional: censo feito pelo governo norte-americano mostra que por lá apenas 25% das vagas do segmento são ocupadas por mulheres, que ganham em média 10 mil dólares a menos que homens em cargos semelhantes.

Atuante no mercado de TI há mais de 10 anos, Simone Kosmalski, diretora da TargetTrust, empresa especializada em cursos e treinamentos na área de TI, e Conselheira do Sindicato das Empresas de Informática do Rio Grande do Sul (SEPRORGS), afirma que o cenário é de escassez, mas também de oportunidade.

Para ela, é preciso explorar as características femininas como um diferencial. “Há características comuns às mulheres, como atenção aos detalhes, criatividade, empatia, solução de problemas e tantas outras. Eu, particularmente, não sofri preconceito: onde trabalhei como desenvolvedora e analista de sistemas, tínhamos os salários equiparados. Acho que com o crescimento da mulher no mercado de trabalho a tendência é estas diferenças diminuírem. Vamos torcer”, projeta.

Mas apesar da perspectiva otimista, a restrição da TI às mulheres ainda é visível também em alguns dos rankings mais populares do mercado: conforme o S&P 100, lista das maiores empresas do mundo compilada pela agência de risco Standard & Poor’s, 20% delas têm, ao menos, uma diretora. O número cai para 10% no ranking do Vale do Silício, palco norte-americano da Tecnologia.

Vamos a exemplos. Entre as gigantes do setor, o Google, a Apple e o Twitter empatam em 30% no percentual de mulheres entre seus funcionários. O Facebook tem um pouquinho a mais, batendo em 31%.

Já um relatório da Harvard Business School mostra que só 10% dos aportes financeiros são feitos em startups comandadas por mulheres.

E a raiz do problema não está, ao contrário de outras questões de desigualdade, atrelada ao grau de educação. Segundo o IBGE, as profissionais de TI do sexo feminino têm grau de instrução mais elevado do que os homens do setor no Brasil, mas, mesmo assim, ganham 34% menos do que eles.

Por mais difícil que pareça, o cenário deve apresentar melhoras – ainda que no longo prazo. O estudo CEO Gender Gap Analysis of the S&P Euro 350 and S&P 500, realizado pela S&P Global Market Intelligence, mostra que um dos efeitos da atual chamada “transformação digital” irá minimizar as diferenças de gênero no setor, com a força especial de segmentos como as mídias sociais e startups.

Alguns movimentos buscam trabalhar para a mudança deste quadro. Um exemplo é o Software Engineering Day (SE Day), evento realizado pela PUC-RS para debater o mercado de Engenharia de Software que ganhou, em 2018, pauta principal no tema da mulher no mercado de trabalho.

Conforme Alessandra Dutra, professora do curso de Bacharelado em Engenharia de Software, da PUC-RS e diretora da AGES – Agência Experimental de Engenharia de Software da universidade, houve uma diminuição, nos últimos anos, no número de meninas que ingressam nos cursos de Computação, e a evasão delas nos cursos acontece de maneira recorrente.

“Tendo em vista esta percepção, algumas iniciativas de atração de meninas do ensino médio para cursos de tecnologia e de acolhimento das mesmas nos cursos de graduação precisam ser feitas, sendo estas prioritárias para nossa atual gestão”, acrescenta Ana Paula Terra Bacelo, professora e coordenadora do Curso de Engenharia de Software da PUC-RS. “Trazer esta temática para o SE Day foi uma forma de mobilizar a comunidade acadêmica para esta discussão e, sobretudo, identificar ações de interesse dos envolvidos, como grupos de trabalho, oficinas tecnológicas, dentre outras”, completa.

Ana Paula destaca que a crença da universidade é que, através da mobilização das alunas a projetos como o SE Day, surjam cada vez mais iniciativas que resultem em profissionais mulheres acreditando em seu potencial, sejam elas de qual área de atuação em TI forem.

Já o diretor de Relacionamento com Instituições de Ensino do SEPRORGS, Roberto Mazzili, ressalta que a interlocução entre a universidade e o mercado de trabalho é imprescindível para a questão da equalização de gêneros no setor.

“Precisamos trazer mais conhecimento para as partes interessadas, sendo estas os alunos, no entendimento do mercado e oportunidades de atuação, as empresas, no que diz respeito às necessidades e habilidades dos e das profissionais que estão buscando para o preenchimento de suas vagas, e a própria instituição de ensino, alinhando o desenvolvimento de competências e habilidades necessárias que precisam ser desenvolvidas para que os estudantes em formação sejam de fato preparados para o mercado”, comenta ele.

O vice-presidente e diretor de Marketing do SEPRORGS, Donald Reis, acrescenta que apoiar a igualdade de gêneros no mercado de trabalho está entre as metas da entidade. “No Sul temos o esforço de nossas colegas da TI, com grupos como o Women IT, que temos apoiado frontalmente. No vale do Silício, este movimento também é latente e uma série de organizações de tecnologia tem realizado suas apostas de comando em uma mulher”, pontua.

Fonte Exame