“Diziam que meus projetos eram malucos e caros”, diz arquiteto chinês

Na terra onde o Estádio Olímpico foi desenhado por suíços; o aeroporto internacional, por um inglês; o ginásio da natação, por australianos; e a nova ópera, por um francês, finalmente um chinês conseguiu espaço entre as mais badaladas estrelas da arquitetura. 

Aos 31, Ma Yansong virou celebridade no seu país ao fazer o caminho inverso: vencer concursos internacionais na Dinamarca, no Japão e na Malásia e construir duas torres de mais de 50 andares no Canadá, tão cheias de curvas que foram apelidadas de Marilyn Monroe. 

Após estudar em Yale com a premiada arquiteta iraquiana Zaha Hadid, com quem trabalhou dois anos em Londres, Ma voltou à China para desenvolver um projeto nunca construído. Foi quando abriu seu escritório, Mad, com um discípulo. Quatro anos depois, tem uma equipe de 40 arquitetos. 

“Não conheço um único arquiteto desempregado na China”, disse Ma à Folha, em seu belo e despojado escritório, em uma área popular de Pequim que ainda não foi destruída para dar espaço a arranha-céus. 

A história de Ma revela o boom arquitetônico do país, onde 50% do cimento mundial é consumido. Há 3.000 prédios em construção apenas na capital chinesa. “Hoje não tenho tempo de aceitar as dezenas de convites que recebo, mas só fiz sucesso aqui depois de ganhar o concurso no Canadá”, diz Ma, confirmando que santo de casa também sofre na China. “Antes diziam que meus projetos eram malucos e caros.” 

Seu mais novo projeto é uma torre de 385 m de altura, mais que o dobro do edifício Itália paulistano, para a gigante siderúrgica Sinosteel, no porto de Tianjin, a 120 km da capital. O revestimento do prédio lembra uma colméia -por conta dos “favos” por onde entra a luz. 

Ele foi convidado a desenhar um novo centro financeiro, com mais de 20 edifícios, para Beihai, no sul da China. “Se o cliente confia, você pode ser ambicioso. As autoridades chinesas andam competindo por quem faz os prédios mais audaciosos, mais arriscados ou os arranha-céus mais altos.” 

Ma é crítico de boa parte dos arranha-céus de Pequim, “cada vez mais iguais, caixotões sem personalidade”. Seus projetos ousam nas curvas e em geometrias arriscadas, “macios”, segundo ele, onde se nota a influência de sua mentora Hadid. 

Curvas presentes em até seus primeiros -e pequenos- projetos, como o clube Hong Luo, centro de convivência construído em 2005 em um condomínio de Pequim.
Tiananmen verde 

Seu projeto mais polêmico e discutido na China ultimamente, porém, tem poucas chances de ser realizado, segundo o próprio arquiteto. É deixar “verde” a praça Tiananmen, da Paz Celestial, a maior do mundo, palco da violenta repressão da ditadura comunista em 1989. 

A praça é sede do Congresso do Povo e entrada da Cidade Proibida, complexo de residências imperiais, onde hoje fica o gigante retrato do líder comunista Mao Tsé-Tung. “Mao a construiu com inspiração na praça Vermelha, de Moscou. Mas o país mudou, não temos mais paradas militares lá, a Tiananmen é lugar de passagem, os pequineses não a usam.” 

Em seu projeto, a praça é revestida de árvores, fontes, espaços para cultura e até um pequeno morro. “Fiz o projeto para provocar, colocar o pequinês a pensar sobre o uso da cidade, e as pessoas adoram árvores. Quem sabe um dia?”, sonha. 

Jovens no Brasil 

Ma diz não ter fórmula para virar arquiteto internacional. “Veja Niemeyer: ele não imitou ninguém, começou construindo no Brasil e é um nome internacional.” Ele conheceu obras de Niemeyer, como o Copan (São Paulo) e a casa de Canoas (Rio) no mês passado, quando esteve no Brasil para o 6º Fórum Internacional de Arquitetura e Construção. “Gostei das curvas do Copan e daquela galeria aberta para a rua.” 

Ao ser ciceroneado pelas obras de Niemeyer, estranhou não ver obras de arquitetos jovens. “Eles não estão construindo? Deveriam vir para a China! É difícil conseguir bons arquitetos, há falta deles!”

Autor: Folha de S.Paulo – Raul Juste Lores