Carros elétricos começam sua investida diante de ceticismo

A indústria automotiva está prestes a embarcar numa aposta de vários bilhões de dólares: a de que carros movidos a bateria serão campeões de venda.

Mais de 20 modelos de carros elétricos devem chegar às concessionárias americanas nos próximos três anos, liderados pelo Nissan Leaf e pelo Chevrolet Volt, previstos para dezembro. O governo de Barack Obama está gastando mais de US$ 5 bilhões em incentivos fiscais para os compradores e empréstimos subsidiados e subvenções para montadoras e outros, para apoiar o esforço, com o objetivo de colocar 1 milhão de carros híbridos recarregáveis na tomada ou totalmente elétricos nas estradas americanas nos próximos cinco anos.

Entre os otimistas do setor está Carlos Ghosn, diretor-presidente da japonesa Nissan Motor Co. e da francesa Renault SA, que prevê que os modelos elétricos vão representar até 10% de todos os veículos vendidos no mundo todo em 2020. A Nissan planeja vender 200.000 do seu modelo elétrico Leaf nos Estados Unidos até o fim de 2013. Mas os céticos — inclusive alguns executivos da Ford Motor Co., da Honda Motor Co., da Toyota Motor Co. e de empresas que fabricam baterias — alertam para o excesso de otimismo. 

Muitos especialistas dizem que as limitações e os cálculos econômicos desses carros não fazem sentido para a maioria dos motoristas — mesmo com um incentivo fiscal de US$ 7.500 para os compradores. Depois da onda inicial de compras de entusiastas, os compradores se tornarão mais raros, preveem alguns.

Os carros elétricos são muito caros, demoram muito para serem recarregados e têm autonomia limitada demais para serem práticos para a maioria dos americanos, dizem eles.

Por exemplo, o Nissan Leaf precisar de oito horas para ser recarregado com um recarregador de 240 volts que para ser instalado custa US$ 2.200. O carro completamente carregado pode percorrer cerca de 160 quilômetros, informa a Nissan, embora isso possa ser ainda menos dependendo da temperatura do ar, velocidade e outros fatores. 

Os preços também serão um obstáculo: US$ 33.000 para o Leaf e US$ 41.000 para o Volt, da General Motors Co., antes do incentivo fiscal federal — cerca de duas vezes o valor de carros similares movidos a gasolina.

A divisão Power Solutions da Johnson Control Inc., que faz baterias para carros, planeja ampliar a produção de baterias com duas novas fábricas. Mas Alex Molinaroli, presidente da divisão, disse que a empresa não espera que todos os carros elétricos decolem. A pesquisa da Johnson Controls descobriu que o grupo de clientes americanos para os quais um carro elétrico faz sentido financeiramente — aqueles que viajam várias milhas por ano, mas em viagens curtas — é muito pequeno, cerca de 3% dos motoristas.

Os veículos elétricos, disse Molinaroli, “serão uma alternativa. Só não achamos que isso vai acontecer tão rápido quanto alguns press releases podem fazê-lo acreditar”.

Em vez disso, a JCI aposta que suas baterias vão encontrar lar em modelos híbridos, que usam motores a gasolina assim como baterias, para permitir maior autonomia.

Sem incentivos do governo — que podem acabar a qualquer momento —, Xavier Mosquet, do Boston Consulting Group, estima que os preços de gasolina precisam subir para US$ 2,10 a US$ 2,40 por litro para que o custo dos carros elétricos se torne atraente para os americanos.

Se o combustível ultrapassar US$ 1 por litro — ante menos de US$ 0,80 atualmente — e com os incentivos atuais do governo ainda em vigor, poderia haver espaço para que, em 2020, 5% das vendas totais sejam de carros elétricos, diz Mosquet.

Nos anos 90, Robert Bienenfeld comandou um esforço da Honda para comercializar um carro elétrico na Califórnia. O veículo, EV Plus, fazia 130 quilômetros com uma carga. Depois de vender cerca de 300 deles em três anos, a Honda desistiu do negócio.

Bienenfeld, que hoje é responsável pela maneira como a Honda cumpre os padrões de emissões de poluentes, não está convencido de que a nova safra de carros elétricos vai vender muito mais.

“Os tempos mudaram e existem pessoas que têm uma consciência social e estão dispostas a agir pelo bem social. Mas, para a maioria dos consumidores, isso não faz sentido”, disse ele.

“Existem momentos decisivos na vida, quando você descobre que não pode pegar o seu filho que está doente” porque não tem bateria suficiente no seu carro “e no dia seguinte as pessoas voltam à concessionária e entregam as chaves”, disse ele.

Takeshi Uchiyamada, engenheiro-chefe da Toyota, concorda que a maior preocupação em relação aos carros elétricos continua sendo a autonomia. Uchiyamada, que é considerado o pai do híbrido Toyota Prius, disse que os elétricos provavelmente estarão confinados a fazer corridas curtas, enquanto os modelos híbridos terão um uso maior.

“Se tivéssemos que ir dez anos à frente, acredito que os veículos elétricos não seriam usados como a maneira comum de dirigir”, disse ele.

A Ford acredita que o futuro está nos carros com motores a gasolina mais eficientes, assim como nos híbridos que podem usar baterias pequenas, recarregáveis e reforçadas pelos motores a gasolina. A Ford espera que, em 2020, apenas 1% a 2% das suas vendas sejam de carros puramente elétricos, enquanto 10% a 15% sejam de híbridos com baterias recarregáveis, disse Nancy Gioia, que dirige os programas da empresa para elétricos, híbridos elétricos e híbridos que podem ser recarregados na tomada.

“Vai demorar algum tempo para que [os elétricos] se tornem realmente uma compra racional”, disse ela.

Ainda assim, algumas grandes empresas do setor automotivo estão se apressando para produzir elétricos. A Honda recentemente se comprometeu a produzir um elétrico em 2012. A Toyota está criando uma versão elétrica do seu utilitário esportivo RAV4 com a Tesla Motors Inc. e um elétrico subcompacto a partir do minúsculo IQ. A Ford planeja uma versão elétrica do seu Focus e uma van elétrica. A BMW AG está produzindo o elétrico MegaCity, com placas de fibra de carbono para reduzir o peso e, desta forma, ampliar a autonomia.

Por que a pressão? Muito disso pode ser explicado pela Califórnia. O Estado americano está exigindo que os seis maiores fabricantes de veículos por vendas ofereçam modelos com emissão zero em 2012 ou estarão sujeitos a grandes multas.

Uma exigência semelhante em relação a carros não poluentes, na década de 90, foi o que levou Honda, GM, Toyota, Nissan e Ford a produzir um volume limitado de carros elétricos na época, esforço abandonado em 2003, depois que a DaimlerChrysler e a GM processaram a Califórnia num tribunal federal.

Autor: The Wall Street Journal