Construção reduz o ritmo dos lançamentos

Depois da queda brusca da cotação das empresas de construção na Bolsa, reflexo da crise financeira internacional, a preocupação com os caixas das companhias tem provocado mudança na velocidade de seus lançamentos, em alguns casos até a redução pela metade, como a CR2 Empreendimentos Imobiliários S.A., que reduziu a meta de lançamentos de R$ 1,2 bilhão para R$ 500 milhões em 2008, projetando R$ 600 milhões para o ano que vem.

Apesar disso, ontem, várias companhias apresentaram resultados, e o lucro líquido de algumas manteve alta no último trimestre – período anterior ao impacto da crise. Mas os balanços demonstraram que os rendimentos começaram a crescer menos no último trimestre, ainda que com desempenho favorável às empresas. A incorporadora Rodobens Negócios Imobiliários S.A., por exemplo, disse que sentiu redução nas vendas a partir do mês de agosto. Ainda assim, a empresa, focada em imóveis residenciais até R$ 150 mil (programa Terra Nova), obteve lucro líquido de R$ 32 milhões no período, e R$ 74 milhões nos últimos nove meses – crescimento de 341% em relação a 2007.

Apesar disso, por conta da desaceleração das vendas em agosto, a empresa viu que era hora de ter mais prudência nos lançamentos no terceiro trimestre, o que explica a contração nas vendas em relação aos trimestres anteriores. “Mesmo com os lançamentos concentrados no final do período (53% na última quinzena de setembro), mantivemos a nossa velocidade de vendas”, explicou a empresa, em comunicado. A receita líquida da Rodobens somou R$ 113 milhões no terceiro trimestre – alta de 9% em relação ao segundo trimestre de 2008. Já a receita nos últimos nove meses foi R$ 283 milhões – 280% a mais, na comparação com o ano passado. Ainda conforme o balanço, a empresa tem R$ 131 milhões disponíveis em caixa e R$ 144 milhões em dívidas oriundas do Sistema Financeiro da Habitação.

Em vendas contratadas, a companhia registrou R$ 103 milhões, acumulando R$ 446 milhões no ano, e lançou empreendimentos com valor geral de vendas (VGV) de R$ 149 milhões, com público-alvo de pessoas com renda familiar de 5 a 10 salários mínimos. Em entrevista recente, o presidente da incorporadora, Eduardo Gorayeb, disse ter “as melhores condições de financiamento do mercado, garantia de entrega dentro do prazo estabelecido, sem burocracia e comprovação de renda, o que favorece uma gama ainda maior da população”.

Outra incorporadora, a CR2 obteve lucro líquido de R$ 35,5 milhões nos primeiros nove meses de 2008, aumento de 223% em relação ao mesmo período do ano passado. Porém, no terceiro trimestre, a empresa obteve avanço de 14%, chegando a R$ 7,2 milhões. No trimestral, a CR2 apurou receita líquida de R$ 71 milhões, expansão de 640% na comparação com o terceiro trimestre de 2007. No acumulado do ano, a receita soma R$ 160 milhões. “O forte crescimento da receita líquida é resultado do aumento do volume de lançamentos [feitos antes da crise ser deflagrada], e da evolução das obras”, disse Rogério Furtado, diretor de Relações com Investidores da CR2.

Segundo o diretor, o lançamento de projetos imobiliários alcançou R$ 129 milhões entre julho e setembro – 50% a mais que no mesmo período do ano passado. “A excelente velocidade de vendas confirma a visão de que o correto posicionamento no mercado deve atender ao crescente aumento do poder de compra das classes economicamente mais baixas, que não demonstra arrefecimento até o momento.”

Socorro

A ajuda do governo federal, que tem anunciado verbas para o setor, recebeu elogios da CR2 e da MRV Engenharia e Participações S.A., empresas de capital aberto. Elas adiantaram que devem procurar se enquadrar dentro do programa de capital de giro. “Quanto mais dinheiro, melhor. Não tenho dúvida de que vamos analisar esse programa e procurar essas linhas (de crédito)”, disse Leonardo Corrêa, da MRV, que foca no segmento econômico. A MRV lançou R$ 507 milhões no terceiro trimestre, incremento de 99% em relação a igual período do ano passado.

Conforme Rogério Furtado, “a CR2 está sempre disposta a acessar mercados e a utilizar todos os instrumentos de captação, por isso, vai pleitear parcelas [do programa]”. A CR2 reduziu a meta de lançamentos de R$ 1,2 bilhão para R$ 500 milhões em 2008, e projeta R$ 600 milhões ano que vem.

Grupo de capital fechado, Ecoesfera Empreendimentos Sustentáveis S.A. não deve tentar abocanhar uma fatia dos recursos a serem disponibilizados pelo governo federal. O Bank of America, segundo maior banco dos Estados Unidos e que comprou o Merrill Lynch, tem participação no grupo Ecoesfera – composto pela incorporadora Esfera, pela imobiliária E-Home e pela construtora Ecohome. “Não tem faltado dinheiro. O Bank of America tem demonstrado muito interesse. Não tenho dívidas. Estamos bem. Não misturamos os caixas, cada um tem seu próprio fluxo”, pontuou o presidente Luiz Fernando Lucho do Valle.

“Creio que o governo é formado por pessoas que devem ter informações corretas sobre o tamanho do problema. Mas não adianta ter crédito parado nos bancos. Os estatais são muito burocráticos e essas medidas requerem agilidade. Outro detalhe é que o maior volume do mercado imobiliário está nas regiões Sul e Sudeste. O problema é que quem precisa mais (da ajuda do governo) corre o risco de ficar sem o dinheiro por conta de lobby junto ao Congresso Nacional. Se percebermos que o dinheiro for mais para o Norte e Nordeste, podemos concluir que prevaleceu o aspecto político. Os políticos de lá são mais ativos. Muitos ex-governadores do Nordeste são donos de construtoras”, comentou.

A Brascan Residential Properties S.A., listada na Bolsa de Valores de São Paulo, não descarta a possibilidade de se beneficiar das medidas do governo. “A Brascan vai avaliar a possibilidade, considerando o prazo e custos adequados para a operação de tomada de recursos. E é interessante que, além da Caixa Econômica Federal, os bancos privados se interessem pela idéia. O efeito principal da medida do governo é o nível de liquidez adequado”, disse Luiz Rogelio, diretor executivo de Relações Institucionais. Segundo ele, “a redução da oferta [de imóveis] vem ocorrendo antes da retração da demanda”. Em junho, a empresa tinha R$ 470 milhões em caixa e deve terminar o ano com lançamentos no valor de R$ 3 bilhões.

Luís Largman, diretor de Relações com Investidores da Cyrela Brazil Realty Empreendimentos e Participações S.A., afirmou que a empresa aguarda detalhes para decidir se vai ou não tentar se enquadrar dentro do programa de capital de giro. Mas sinalizou que pode, sim, pedir o socorro. “O pacote está em gestação. Mas tudo o que houver de captação a longo prazo auxilia o setor, porque o financiamento para os clientes é de longo prazo.” Mas também não descartou a ajuda federal. “Pode ser que vamos precisar.”

Autor: DCI