O Cristo Redentor, que completa 90 anos nesta terça-feira (12), é uma obra em concreto armado e, até hoje, a maior estátua em art-déco do mundo, com 38 metros de altura (contando o pedestal).
A técnica e o estilo surgiram no início daquele século 20 — quando montar um canteiro de obras a 710 metros de altitude era um grande desafio.
O g1 mostra agora como foi a construção do monumento, entre 1926 e 1931, e responde a perguntas sobre a empreitada.
O que é art-déco?
As Artes Decorativas nasceram na Europa dos anos 1910 e ganharam expressão em 1925, em Paris, com uma exposição internacional. O art-déco (leia-se decô) configura um estilo não só arquitetônico, mas também artístico. Influenciou a pintura, o cinema, a moda e o design — como móveis, eletrodomésticos e até carros. É mais presente na arquitetura.
As principais características da art-déco são:
- Luxuosidade
- Uso de formas geométricas
- Design abstrato
- Emprego dos materiais: marfim, jade e laca
- Linhas retas e circulares estilizadas
- Animais e mulheres são temas comuns.
A Central do Brasil é outro exemplo do estilo no Rio de Janeiro.
O que é concreto armado?
É uma técnica que utiliza suportes, ou moldes, para assentar o concreto. A armação consiste em vigas de sustentação, vergalhões de diferentes espessuras e redes metálicas que dão a forma final. Também chamadas de mantas, são uma espécie de “cama” onde se joga a argamassa.
O Cristo é maciço?
Não, o Redentor é “oco” como um prédio, com “andares” e “paredes”.
O Cristo tem tijolos?
Não. Toda a estrutura é de concreto armado, até o pedestal.
Quem construiu o Cristo?
Centenas de operários brasileiros liderados por:
- Heitor da Silva Costa — engenheiro e arquiteto, vencedor do concurso nacional em 1921;
- Heitor Levy —mestre de obras;
- Pedro Fernandes Viana — engenheiro fiscal.
Quem desenhou o Cristo?
Sob críticas da Igreja e de acadêmicos, Silva Costa abandonou o projeto que ficou apelidado de Cristo da Bola e decidiu fazer um Jesus de braços abertos (entenda no vídeo abaixo). O pintor Carlos Oswald desenhou a ideia, e Silva Costa escolheu em Paris o escultor Maximilien Paul Landowski para a imagem definitiva. Landowski já era um expoente em art-déco.
Como Landowski construiu o Cristo?
O escultor jamais pisou no Rio — nem durante a obra, nem após a inauguração —, pois era bastante requisitado. A solução encontrada foi fazer uma miniatura em gesso de 4 metros de altura — o Cristo do Corcovado seria quase oito vezes maior, com 30 metros (sem o pedestal) — e trabalhar com quadrículas e moldes, que iriam para o Rio de navio.
O que são quadrículas?
É uma técnica tão antiga quanto as Pirâmides do Egito. Consiste em desenhos em escala que, ampliados, ainda guardam todos os detalhes do projeto.
Como o Cristo foi quadriculado?
Landowski e Silva Costa recorreram a Albert Caquot, engenheiro, para fazer todos os cálculos estruturais. O primeiro passo dos dois franceses foi cobrir a miniatura de gesso com dezenas de arames, como se fosse para amarrá-la, dos pés aos braços, até os punhos. Esses arames foram retirados, e o contorno de cada um foi transposto para folhas de papel quadriculadas.
É a mesma lógica para fazer um molde de plástico em 3D. As impressoras tridimensionais vão depositando os filamentos de baixo para cima, plano após plano. Assim foi com o Cristo de Landowski e Caquot, que mandaram essas instruções em um roteiro de dezenas de desenhos empilháveis.
O que foi feito em moldes?
Como eram partes bem mais detalhadas, Landowski fez, no gesso, as mãos e a cabeça em tamanho real. Mas elas não vieram inteiras para o Rio. Como cada uma tinha quase quatro metros, o escultor as seccionou e enviou as partes em cerca de 50 caixas, com as instruções para o “quebra-cabeça” ser remontado aqui.
Como os moldes da cabeça e das mãos viraram estátua?
O concreto não foi despejado em cima do molde inteiro, como num fondue. Em São Gonçalo, cada seção foi imersa numa “piscina” de argamassa rala. Quando a mistura secava, o gesso era quebrado, e o que sobrava era o negativo da peça. Aí, com o auxílio de uma grade, despejavam um concreto mais forte sobre essa forma. Mais uma vez esperavam secar, para quebrar a argamassa rala. Pronto: saía a parte definitiva, pronta para ser encaixada lá em cima.
Como o material chegou até o alto do Corcovado?
Prioritariamente de trem. A estrada de ferro, aliás, completou 137 anos no último sábado (9). Já a água para finalizar o concreto foi bombeada de uma nascente do maciço.
O Cristo está fincado na rocha?
Sim. São quatro vigas cravadas no alto do Corcovado, que serviram de base para o pedestal. A rocha foi dinamitada, e o vigamento também corrigiu um desnível que havia no topo do monte.
Como o corpo do Cristo foi erguido?
O bloco vertical de concreto armado que dá forma ao corpo de Jesus é muito parecido com um prédio. No caso do Redentor, são 13 “andares”, formados por lajes vazadas. “Diagonais” entre elas ajudam a reforçar a estrutura.
Como os braços foram construídos?
Em outro feito para a época, graças aos cálculos de Caquot, cada braço foi instalado “em balanço” — termo na engenharia que designa toda parte que se projeta para além da fachada de uma construção, sem estrutura de sustentação aparente. Marquises, por exemplo, são estruturas em balanço.
Como o Cristo foi ‘vestido’ com a túnica?
Com o “prédio” já estruturado, operários instalaram as redes — ou mantas — metálicas, segundo os desenhos dos arames, e aí o concreto foi aplicado.
Por que o Cristo tem pedra-sabão?
A esteatita, ou pedra-sabão, é um material altamente resistente que não muda de cor, não retém calor, não se dilata nem se contrai, resiste a ácidos e não absorve água da chuva. A ideia partiu de Silva Costa, que citou as obras de Aleijadinho — feitas no século 18 e de pé até hoje.
Optou-se por um mosaico de milhares de pedaços de esteatita. Quem cortou foram mulheres que se revezavam na Matriz de Nossa Senhora da Glória, no Largo do Machado. Eram pastilhas triangulares finíssimas de 3 milímetros de espessura e 4 cm de lado.
As plantonistas do Largo do Machado também colavam os triângulos em cartolinas, já formando pequenos mosaicos, que eram transpostos para cobrir o concreto do Cristo.
Quantas pastilhas de pedra-sabão há no Cristo?
Estima-se que pelo menos um milhão.
Há pedra-sabão do lado de dentro?
Não, só do lado de fora. Mas com uma exceção: o coração.
Por que há um coração do lado de dentro?
Foi um pedido do cardeal-arcebispo Dom Sebastião Leme, que queria homenagear o Sagrado Coração de Jesus. Está no nono andar do prédio do Cristo, na mesma altura do de fora.
Como se entra na parte interna da estátua?
Não há uma escada do pedestal até a base da imagem. Ou se usa uma móvel, ou se recorre a andaimes.
Como é feita a restauração do monumento?
Todos os anos, pelo menos seis raios atingem a imagem, causando danos. Quando há buracos no concreto, é colocado um pouco de argila, para então assentar a argamassa e o mosaico de pedra-sabão.
Periodicamente, trocam-se triângulos de esteatita. Ora com o auxílio de andaimes, ora com rapel.
O Cristo tem para-raios?
Sim, na cabeça, em forma de coroa, e ao longo dos braços. O sistema foi reforçado para os 90 anos.
O Cristo está seguro lá em cima?
Sim, vários estudos estão em andamento para avaliar a integridade dos vergalhões e das redes e a resistência do concreto.