Para alguns compradores de aço dos Estados Unidos, está mais barato hoje comprar aço da China ou do Brasil do que da Pensilvânia.
O motivo: a diferença entre os preços de quase todos os tipos de aço produzidos nos EUA e do aço estrangeiro atingiu níveis recordes. A ampliação dessa diferença, atribuída ao excesso de oferta global e à forte demanda por parte das fabricantes de automóveis, provocou um salto das importações americanas, que devem chegar a 3,2 milhões de toneladas em janeiro, um aumento de 23% em relação aos 2,6 milhões de toneladas importadas em janeiro de 2013.
A diferença média de preço entre os EUA e a China saltou para US$ 159 por tonelada. Um ano atrás, a tonelada de aço americano custava, na verdade, US$ 19 mais barato, de acordo com a empresa de análise de preços CRU.
Howard Allen, vice-presidente da Midland Steel Warehouse Corp., está entre os compradores americanos que estão ampliando as encomendas de aço estrangeiro à medida que a diferença de preços cresce. A Midland Steel Warehouse, de Nova York, compra bobinas de aço e as corta em tamanhos específicos para a construção, iluminação, móveis de escritório e outros produtos.
Um ano atrás, Allen usava siderúrgicas nacionais para suprir quase todas as 4.000 toneladas de aço que sua empresa precisa a cada mês. Agora, 30% do produto que compra mensalmente vêm do Brasil, China, e Índia – e a qualidade é semelhante, diz ele. Depois de levar em conta todos os custos”, incluindo o transporte, o aço importado “acaba sendo até 10% mais barato”, diz Allen.
De fato, o Instituto Aço Brasil confirma esta tendência. As siderúrgicas brasileiras vêm registrado um aumento constante nas exportações de aço para o mercado americano. Em 2012, ano para o qual o instituto tem dados mais recentes, as siderúrgicas brasileiras exportaram 3,6 milhões de toneladas de aço para os EUA, 36,9% a mais que em 2011. Para 2013, o instituto estima que os EUA tenham recebido 45% do total exportado pelo Brasil.
Os preços do aço nos EUA se mantiveram relativamente baixos até meados do ano passado, quando grandes produtores, como a U.S. Steel Corp., a AK Steel Holding Corp. e a ArcelorMittal puderam aumentar seus preços, em grande parte por causa da forte demanda da indústria automobilística e de uma melhora no setor da construção. Nos EUA, o preço médio da bobina de laço laminado a quente, referência do mercado, é hoje de US$ 676, cerca de 10% mais alto que o de um ano antes. Em comparação, o preço atual para as mesmas bobinas laminadas a quente produzidas pela China para os compradores dos EUA é de US$ 540 a tonelada.
Ao mesmo tempo, embora o governo chinês tenha tomado medidas para fechar usinas antiquadas, a produção de aço do país cresceu 7,5% em 2013 ante o ano anterior, para um recorde de 779 milhões de toneladas, sete vezes a do Japão, o segundo maior produtor de aço do mundo. Com a desaceleração do crescimento da demanda na China e em outros lugares, “havia um excesso real no mercado”, diz John Packard, diretor da “Market Update Steel”, uma publicação do setor.
Isso fez com que a diferença entre os preços nos EUA e os de outros produtores de aço importantes, como o Brasil e a Alemanha, começasse a subir no fim do ano, diz David Lipschitz, analista da CLSA Americas. Foi aí que compradores americanos, como Allen, da Midland Steel Warehouse, passaram a encomendar aço importado.
“É preciso dois ou três meses para o aço chegar aqui”, diz Lipschitz. Os preços mais baixos fazem com que a espera valha a pena, diz Allen.
As siderúrgicas americanas têm se beneficiado dos preços mais altos no mercado interno, mas a expectativa é de que o aumento das importações provocará queda nos preços e encomendas de algumas das empresas. Analistas esperam que a U.S. Steel divulgue prejuízo no quarto trimestre na teleconferência marcada para hoje e que a AK Steel, que divulga resultados amanhã, não passe do ponto de equilíbrio no mesmo período. Os efeitos financeiros das crescentes importações começaram a ser sentidos este mês, quando o aço encomendado no fim do ano passado começou a chegar nos portos americanos.
AK Steel, U.S. Steel e ArcelorMittal não quiseram comentar.
O diretor-presidente da U.S. Steel, Mario Longhi, disse a analistas em outubro que esperava que autoridades comerciais dos EUA impusessem tarifas que resultassem em um ajuste nos preços de importação “que melhor reflitam uma condição normal de mercado versus preços distorcidos por práticas comerciais desleais”.
O fechamento de uma usina importante no Estado de Baltimore, na região leste dos EUA, também influenciou a decisão de Allen de comprar aço estrangeiro. A usina, que pertencia à RG Steel LLC, fechou há dois anos por causa de altos custos trabalhistas e falta de demanda na região. A RG Steel atravessa agora uma recuperação judicial.
“Não há uma grande fonte de aço [em boa parte da] Costa Leste americana”, diz Allen.
Os compradores de aço das regiões Sul e Centro-Oeste dizem que importar não é tão atraente, porque eles podem comprá-lo de siderúrgicas próximas e evitar os custos de transporte.
Certamente, os EUA não têm capacidade de produção de aço suficiente e dependem de importações há décadas. O país consome cerca de 108 milhões de toneladas por ano, por volta de 75% desse total são produzidos por siderúrgicas locais. O resto vem de produtoras estrangeiras, diz Packard. As importações poderiam representar uma fatia maior do mercado, cerca de 30%, até o fim deste ano, se a diferença de preços se mantiver tão grande, tornando mais barato comprar aço estrangeiro, diz ele.
“Esse é o maior volume de pedidos de [aço] importado para o primeiro trimestre que vi nos últimos cinco anos”, diz um operador de aço que preferiu não se identificar e cuja corretora intermedia a compra e venda do produto entre empresas americanas e produtores estrangeiros. “Agora que as pessoas esperam seus barcos chegar, está suavizando, mas isso vai persistir no segundo trimestre.”
As importações são a principal razão pela qual a maioria dos analistas espera que os preços do aço nos EUA caiam este ano. Josh Spoores, que analisa os preços para a CRU, diz que as importações devem manter a força em fevereiro e março. “Haverá uma grande onda de importações no primeiro semestre”, diz ele, acrescentando que os preços provavelmente atingiram o pico no ano.
Detroit tem fome de aço no momento. As montadoras americanas devem vender 16 milhões de veículos este ano, contra 10,4 milhões em 2009.
Mesmo assim, para alguns compradores de aço americanos, a importação não é a melhor alternativa. Allen diz que preferiria que a Midland Steel Warehouse comprasse todas as 50.000 toneladas de aço que consome anualmente de produtores nacionais. “E isso vai voltar”, diz ele. “Este negócio é sempre cíclico.”
Autor: Valor Econômico