Britânicos apostam em venda de expertise olímpica para o Brasil

Neste sábado, um dia antes do encerramento da Olimpíada, um evento organizado pela Câmara Britânica de Comércio e Investimento (UKTI, na sigla em inglês) reunirá em Londres empresários e autoridades dos dois países com um duplo objetivo.

Primeiro, marcar a passagem do bastão olímpico para o Rio de Janeiro. Segundo, lançar luz sobre “as oportunidades” de negócios de “alto valor” que essa transferência abre para empresas britânicas no Brasil.

Até agora, pelo menos 20 empresas made in Britain já ganharam contratos relacionados à Olimpíada de 2016 ou à Copa do Mundo de 2014, segundo a cônsul britânica no Rio, Paula Walsh.

Alan Collins, diretor para o Legado Olímpico da UKTI calcula que as companhias britânicas possam abocanhar, principalmente em parcerias com firmas brasileiras, um total de 1 bilhão de libras (R$ 3,1 bilhão) em contratos no Brasil.

Parque Olímpico

O exemplo mais emblemático entre os que já selaram sua participação nos megaeventos brasileiros é o da filial britânica da AECOM, que fez o projeto do Parque Olímpico de Londres e recentemente ganhou o concurso para projetar também o Parque Olímpico do Rio, como parte de um consórcio que inclui ainda a empresa de arquitetura Wilkinson Eyre e a de engenharia Expedition.

Mas a lista dos que já assinaram contratos também inclui empresas da área de transporte (Steer Davies Gleave), comunicações (VERO), recursos humanos (Odgers Berndtson) e sustentabilidade (Useful Simple).

David Slater, da London & Partners, órgão público que promove os negócios da capital britânica, diz que pequenas e médias empresas também podem tirar proveito do interesse do Brasil por “expertise” olímpica. Ele cita como exemplos a Ashbury Training, que forneceu softwares de treinamento durante a preparação para a Olimpíada de Londres, e uma pequena empresa que desenhou a tocha Olímpica e a Paraolímpica – a Barber Osgerby.

Já chegou-se a cogitar até que alguns estádios e estruturas desmontáveis usados em Londres fossem levados para o Rio para serem reutilizados em 2016. “Houve conversas sobre as estruturas de um estádio de basquete, mas nesse caso chegou-se a conclusão que isso não seria vantajoso”, disse à BBC Brasil Marcio Fortes, presidente da Autoridade Pública Olímpica (APO) brasileira.

O embaixador do Brasil no Reino Unido, Roberto Jaguaribe, confirma que há um grande interesse em todos o tipos de colaboração, mas faz uma ressalva: “O Brasil está sempre mais interessado em se capacitar do que em em adquirir as coisas prontas”, diz, sem descartar, porém, que haja a necessidade de compras específicas.

Tábua de salvaçãoNos últimos quatro anos, as obras e contratos relacionados à organização da Olimpíada ofereceram alívio para algum setores da economia britânica, em meio ao que se tornou a pior recessão do país em 50 anos.

Agora, com as previsões para o crescimento do PIB em 2012 girando em torno de 0%, uma das tábuas de salvação de tais empresas pode ser justamente a exportação dessa tecnologia de nicho e serviços aprimorados com a experiência olímpica para países que sediarão eventos esportivos internacionais.

Walsh registrou, nos últimos três anos, um aumento de 500% nas manifestações de interesse de empresas britânicas em fazer negócios com o Brasil – e igual crescimento no interesse de autoridades brasileiras pela expertise britânica.

“As relações bilaterais estão recebendo um impulso importante por causa dos Jogos”, disse Walsh à BBC Brasil. “Nos últimos 18 meses foram realizadas pelo menos 10 missões britânicas ao Brasil e haverá muitas outras com o fim da Olimpíada.”

Interesse BrasileiroO entusiasmo de autoridades brasileiras em relação aos Jogos em Londres – cuja organização foi considerada um sucesso – também impulsiona a parceria. “Os britânicos estão há anos aprendendo como se faz uma Olimpíada e há muitas áreas em que o conhecimento que eles adquiriram nesse processo poderia interessar ao Brasil”, afirma Fortes.

Como exemplo, o presidente da APO menciona as estruturas montadas para a competição de canoagem slalom, no centro aquático de Lee Valley. “Trata-se de um projeto hidráulico complexo, em que foi necessário pensar até nos menores detalhes, como um sistema para manter as aves fora do rio artificial”, explica.

“Especialistas e engenheiros britânicos penaram por dois anos para entender como esse projeto poderia ser feito e no final o resultado foi bom. Agora nós precisamos fazer o mesmo e a sua colaboração poderia ser útil.”

Cerca de 250 observadores brasileiros divididos em dois grupos – o primeiro ligado ao governo e o segundo ao comitê organizador da Rio-2016 – estão acompanhando funcionários britânicos na organização e implementação de todos os aspectos do evento em Londres, desde a recepção dos atletas no aeroporto até a segurança nas entradas dos estádios.

Os esquemas de observação seguem as diretrizes de um acordo assinado pelos dois países em 2009, no qual ambos se tornaram “parceiros” na realização das Olimpíadas e da Copa do Mundo. Mas eles também oferecem aos britânicos uma oportunidade ímpar de promoção das soluções desenvolvidas para os Jogos de Londres.

ExperiênciaEntre as áreas em que os britânicos esperam obter vantagem por sua experiência olímpica estão segurança, transportes, gestão de multidões e tecnologias “verdes”. “Haverá muita demanda por serviços de consultoria nessas áreas”, acredita a cônsul britânica no Rio.

As oportunidades de negócios também seriam impulsionadas pelo fato de que, em muitos aspectos, o Brasil já está se inspirando na Olimpíada de Londres para organizar a Rio-2016.

Em especial, o foco na “sustentabilidade” dos Jogos e no seu “legado econômico” deve ser mantido, enquanto os chineses, por exemplo, pareciam estar mais preocupados em usar a Olimpíada de Pequim para exibir uma China moderna e poderosa.

“O Rio está preocupado em não construir 'elefantes brancos', algo que também foi importante para Londres”, diz Jaime Gornsztejn, presidente da Câmara Brasileira de Comércio na Grã-Bretanha, explicando que, por isso, há amplo interesse no uso de estruturas desmontáveis nos estádios, como arquibancadas provisórias.

É claro que as especificidades de cada país limitam a reciclagem de alguns esquemas logísticos usados em Londres. No que diz respeito à infraestrutura de transporte, por exemplo, o desafio evidentemente é muito maior para o Rio do que foi para a capital britânica. A questão da violência urbana também é um ponto mais sensível para o Brasil.

“Mas, ao sediar esses eventos internacionais, os brasileiros também precisarão lidar com riscos na área de segurança aos quais não estão tão acostumados e sobre os quais os britânicos têm amplo conhecimento – como a prevenção de atentados terroristas e crimes cibernéticos”, cita Walsh.

ParceriasMartin Raven, ex-cônsul britânico em São Paulo que hoje oferece consultoria para empresas que querem investir no Brasil, faz o alerta de que o mercado brasileiro não é para iniciantes.

“As oportunidades de negócio no longo prazo são amplas, mas também há dificuldades em relação à regulamentação e sistema de impostos – por isso uma parceria com empresas locais pode ser bastante útil”, aconselha.

De fato, as empresas britânicas recebem das próprias autoridades do país a recomendação de que a melhor forma de entrar no mercado brasileiro é firmando parcerias com firmas locais.

Algumas companhias da área de engenharia e arquitetura já estariam negociando projetos conjuntos com construtoras brasileiras.

“Será complicado para as britânicas ganharem a licitação para grandes projetos de infraestrutura sozinhas – porque o Brasil já tem grandes empreiteiras que estão se mobilizando para garantir esses negócios”, acredita Raven. “Mas sem dúvida deve haver espaço para parcerias, consultorias, projetos de planejamento e fornecimento de materiais e equipamentos especializados.”

Autor: BBC