Carbono sem fim

As tecnologias atuais de geração de energia não são suficientes para reduzir as emissões de carbono aos níveis considerados necessários para evitar os riscos ao planeta promovidos pelo aquecimento global.

A afirmação é de um artigo publicado por cientistas dos Estados Unidos e do Canadá na edição desta sexta-feira (10/9) da revista Science. Estima-se que, para evitar os riscos das mudanças climáticas globais, seria preciso evitar que a temperatura média do mundo chegasse a 2º C acima dos níveis anteriores à Revolução Industrial.

Modelos climáticos atuais indicam que, para atingir esse objetivo, será preciso limitar as concentrações de dióxido de carbono na atmosfera em menos de 450 partes por milhão (ppm).

O problema é que permanecer abaixo desse nível implica diminuir substancialmente as emissões de combustíveis fósseis, algo que os países industrializados não estão conseguindo fazer. O nível atual é de aproximadamente 385 pp. Antes da Revolução Industrial, estava abaixo de 280 ppm.

Steven Davis, da Instituição Carnegie, de Washington, e colegas avaliaram o que ocorreria com o planeta se nenhum outro dispositivo emissor de CO2 fosse fabricado.

Nessa situação hipotética sem uma única fábrica ou automóvel novo, a infraestrutura energética atual do mundo emitiria cerca de 496 bilhões de toneladas de CO2 nos próximos 50 anos. Isso seria suficiente para estabilizar os níveis do gás na atmosfera em 430 ppm e deixaria a temperatura média em 1,3º C acima dos níveis pré-industriais.

Os riscos do aquecimento global teriam sido vencidos, mas, segundo os cientistas, o cenário hipotético ilustra bem a situação atual vivida pelo planeta. Somente de veículos automotivos, o mundo ganha a cada dia não um, mas cerca de 170 mil novos – isso segundo dados da International Organization of Motor Vehicle Manufacturers de 2009, que representaram, em meio à crise econômica mundial, queda de 13,5% em relação à produção do ano anterior.

“Até agora, os esforços feitos para diminuir as emissões por meio de regulações e de acordos internacionais não funcionaram. As emissões estão aumentando mais do que nunca e os programas para desenvolver fontes de energia ‘neutras em carbono’ estão, nos melhores casos, ainda muito incipientes”, disse Martin Hoffert, professor emérito do Departamento de Física da Universidade de Nova York, em artigo comentando o estudo de Davis e colegas na mesma edição da Science.

Mas a pior notícia é que a situação tende a se agravar ainda mais. Segundo os pesquisadores, as fontes das emissões mais ameaçadoras ao planeta ainda não foram construídas. Isso porque o mundo e suas economias simplesmente continuarão a crescer. Um exemplo é o carvão.

“À medida que o pico na produção de petróleo e de gás natural se aproxima, a produção de carvão aumenta, com novas usinas movidas a carvão sendo construídas na China, Índia e nos Estados Unidos”, disse Hoffert.

“Investimentos maciços serão cruciais para permitir que a pesquisa básica encontre e desenvolva tecnologias possíveis de serem aplicadas comercialmente e em massa. Mas a introdução de tecnologias neutras em carbono também exige, no mínimo, que sejam revertidos incentivos perversos, como os atualmente existentes para subsidiar a produção de combustíveis fósseis e que se estima serem 12 vezes maiores do que os aplicados para a energia renovável”, afirmou.

Os artigos Future CO2 Emissions and Climate Change from Existing Energy Infrastructure (doi:10.1126/science.1188566), de Steven Davis e outros, e Farewell to Fossil Fuels? (doi: 10.1126/science.1195449), de Martin Hoffert, podem ser lidos por assinantes da Science em www.sciencemag.org.

Autor: Agência Fapesp