Aspectos políticos e Econômicos de Itaipu

Antecedentes

Em 1962, o governo brasileiro encomendou estudos sobre o aproveitamento hidrelétrico das Sete Quedas e do longo cânion a jusante dos saltos. A tarefa ficou a cargo do escritório do engenheiro Octávio Marcondes Ferraz construtor da usina de Paulo Afonso. A proposta final, que nunca foi levada adiante, previa uma usina com capacidade de 10 mil megawatts, para produzir 67 milhões de megawatts-hora por ano, o equivalente a três vezes o consumo do Brasil na época, situada inteiramente em território brasileiro.

Com a construção em 1962, da Ponte da Amizade sobre o rio Paraná, projeto do Engenheiro paulista José Rodrigues Leite de Almeida, que liga as cidades de Foz do Iguaçu no Brasil e Ciudad Del Leste no Paraguai, abrindo caminho para as exportações paraguaias pelos portos brasileiros e com a assinatura, em 1966, da Ata de Iguaçu para solução de litígios entre os dois países, começaram a prosperar as idéias de aproveitamento conjunto do potencial hidrelétrico comum “desde e inclusive o Salto de Sete Quedas até a foz do Rio Iguaçu”.

Extensivos estudos técnicos efetuados pelo consórcio das empresas IECO e ELC e intensas negociações levaram a uma aproximação das posições e progressiva eliminação de divergências com o atendimento pelo Brasil, dentro do espírito já manifestado por D.Pedro II , em 1871, da maioria das reivindicações da parte paraguaia, que possibilitaram a assinatura em 26 de abril de 1973, do Tratado de Itaipu, instrumento legal entre Brasil e Paraguai, para o aproveitamento hidrelétrico do Rio Paraná pelos dois países. Dentre as concessões efetuadas pelo Brasil e constantes do acordo, figuraram além do abandono do projeto de uma usina inteiramente nacional, a manutenção da freqüência de 50 ciclos/s para as 10 turbinas da parte paraguaia, o que obrigou à construção de estações conversoras para 60 c/s e linhas de transmissão em corrente contínua para transporte da energia não consumida pelo Paraguai até São Paulo, com um notável incremento de custos das obras.

A solução jurídica proposta pelo prof.Miguel Reale e aceita pelas partes, previu:

a) A formação de uma entidade bi-nacional para execução das obras e operação da usina, denominada Itaipu Binacional
b) A responsabilidade do Governo brasileiro pela obtenção dos recursos financeiros para execução das obras através de créditos de curto prazo de bancos estatais estrangeiros e instituições financeiras internacionais e locais, refinanciados à Itaipu Binacional em 50 anos e cuja forma de correção foi alterada em 2007 (ver abaixo).
c) A dívida terminará de ser paga em 2023 (notas do Relatório da Itaipu )

Aspectos relevantes do Tratado de Itaipu

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Artigo XIII – A energia produzida pelo aproveitamento hidrelétrico a que se refere o Artigo I será dividida em partes iguais entre os dois países, sendo reconhecido a cada um deles o direito de aquisição, na forma estabelecida no Artigo XIV, da energia que não seja utilizada pelo outro país para seu próprio consumo.
Parágrafo único – As altas partes contratantes se comprometem a adquirir, conjunta ou separadamente, na forma que acordarem, o total de potência instalada.

Anexo C
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III – O custo do serviço de eletricidade será composto das seguintes parcelas anuais:
III.1 – O montante necessário para o pagamento, às partes que constituem a Itaipu, de rendimentos de doze por cento ao ano sobre sua participação no capital integralizado, de acordo…….
III.2 – O montante necessário para o pagamento dos encargos financeiros dos empréstimos recebidos.
III.3 – O montante necessário para pagamento da amortização dos empréstimos recebidos.
III.4 – O montante necessário para o pagamento dos “royalties”…..que não poderá ser inferior, anualmente, a dezoito milhões de dólares….
III.5 – O montante necessário para o pagamento…..de encargos de administração e supervisão….
III.6 – O montante necessário para cobrir as despesas de exploração.
III.7 – O montante do saldo, positivo ou negativo, da conta de exploração do exercício anterior.
III.8 – O montante necessário à remuneração a uma das Altas Partes Contratantes, equivalente……, por gigawatt-hora cedido à outra Alta Parte Contratante……
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IV.1 – A receita anual, decorrente dos contratos de prestação dos serviços de eletricidade, deverá ser igual, em cada ano, ao custo do serviço estabelecido neste Anexo.
IV.2 – Este custo será distribuído proporcionalmente às potências contratadas pelas entidades supridas.
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V.2 – O valor dos rendimentos sobre capital, dos “royalties” do ressarcimento dos encargos e da remuneração mencionados respectivamente, em III.1,III.4, III.5 e III.8, anteriores, será mantido constante de acordo com o estabelecido no parágrafo 4º do Artigo XV do Tratado.

VI – Revisão

As disposições do presente Anexo serão revistas, após o decurso de um prazo de cinqüenta anos a partir da entrada em vigor do Tratado, tendo em conta, entre outros aspectos, o grau de amortização das dívidas contraídas pela Itaipu para a construção do aproveitamento e a relação entre as potências contratadas pelas entidades de ambos os países.

(Publicado no “diário Oficial de 30.08.1973, pag.8645)

Os valores originais das remunerações e ressarcimentos ao Brasil e Paraguai previstos no Anexo C do Tratado, em dólares da época e elencados abaixo, além de serem atualizados pelos índices da inflação americana, foram revisados de acordo com os ajustes reais do custo das obras e com o custo da energia elétrica produzida, conforme detalhes nas páginas seguintes.

Notas do Relatório Anual de 2007 da Itaipu Binacional:

Além dos Ressarcimentos e Remunerações acima que fazem parte do custo da tarifa de Itaipu, divididos em parcelas iguais entre Paraguai e Brasil, a remuneração adicional paga, em dólares equivalentes, exclusivamente pelo Brasil ao Paraguai, pela cessão de parte de sua energia, também é revisada periodicamente pelos índices ajustados da inflação americana (Notas do Relatório) a saber:

Fatores de reajuste dos valores contratuais de Itaipu

Os sucessivos reajustes efetuados ao longo do contrato, em função dos índices de inflação acima mencionados e dos ajustes acordados, fazem com que o Paraguai, além do fornecimento firme de energia para a totalidade de seu consumo, receba uma receita anual garantida que em 2007 atingiu um valor de US$ 354,2 milhões contra US$ 352,8 milhões em 2006. Os detalhes respectivos e os montantes de energia comprada e os valores pagos pela Eletrobrás (Brasil) e pela Ande (Paraguai) nos anos de 2007 e 2006 constam das tabelas seguintes, conforme Notas dos Relatórios Anuais da Itaipu Binacional, publicados juntamente com os Balanços respectivos.

Preços pagos pela energia fornecida por Itaipu

No tocante ao fornecimento de energia, tendo em vista a obrigatoriedade de contratação da totalidade da potência instalada e os acordos estabelecidos, as tarifas médias pagas em 2007 pelas Entidades compradoras: Eletrobrás e Ande , conforme detalhes da tabela anterior , foram as seguintes:

Brasil Paraguai

US$ 38,66 /MWh US$ 22,40 /MWh

No caso do Brasil, o cálculo da tarifa final acima resultou da média de custo de US$ 36,25/MWh sobre metade do fornecimento de sua propriedade (45.161 GWh) e US$ 41,55/MWh pela parcela cedida pelo Paraguai (37.591 GWh) naquele ano.
Observa-se que além de contar com uma receita anual garantida, o Paraguai recebe de Itaipu a totalidade de sua energia a preços extremamente favorecidos. Este fato lhe confere uma competitividade ímpar no mercado internacional e uma oportunidade excepcional de desenvolvimento do país, se devidamente utilizada para a atração de investimentos em indústrias energo-intensivas ou diversificadas e desde que acompanhada de políticas coerentes que assegurem a confiança dos investidores, baseadas em: planejamento estratégico, regras estáveis e respeito aos contratos firmados.

Conclusões

• No tocante à Itaipu, os tratados e contratos firmados possuem todos os dispositivos para garantir a equidade de direitos e obrigações inicialmente pactuados e promover os ajustes necessários em função de eventuais mudanças do ambiente financeiro e econômico internacional.
• O Brasil, mesmo enfrentando situações adversas, interna e externamente, sempre pautou sua conduta pelo estrito cumprimento dos contratos e acordos firmados, mesmo arcando com os pesados ônus deles decorrentes, dentro de um espírito de mútuo entendimento e respeito pelos países vizinhos e parceiros, sem veleidades hegemônicas, mas firme na defesa de seus legítimos interesses e sem complexos de culpa por supostas ações expansionistas que lhe possam ser errônea e indevidamente atribuídas.

“É uma terra que odeia a guerra e mais: que praticamente a desconhece. Há mais de um século e com exceção da guerra do Paraguai, um absurdo provocado por um ditador fora de seu melhor juízo, o Brasil resolveu todos os seus problemas fronteiriços de comum acordo com seus vizinhos e apelando para a mediação internacional. Não são os generais, os seus heróis e o seu orgulho e sim os estadistas, como Rio Branco que souberam, com a razão e a conciliação, evitar as guerras. Completo em si mesmo, as fronteiras lingüísticas coincidindo com as fronteiras territoriais, inexistem aqui quaisquer vocações expansionistas, quaisquer ambições imperialistas. Vizinho algum pode reivindicar dele qualquer coisa e o Brasil não tem nada a reivindicar de nenhum de seus vizinhos. Nunca a paz mundial esteve ameaçada por sua política e mesmo em tempos como os atuais, é impossível imaginar que essa regra fundamental de seu pensamento político, essa opção pelo entendimento e pela tolerância possam alguma vez modificar-se.” (Stefan Zweig – Brasil – Um país do Futuro).

Autor: Miracyr Marcato