Os erros do passado

As ruínas romanas espalhadas pela Europa e norte da África são elementos presentes em qualquer álbum de recordação. Remetem os viajantes a um passado distante e mostram as realizações do homem e a grandeza das civilizações. Mas qualquer engenheiro com um mínimo de interesse por história percebe uma grande diferença na quantidade de ruínas romanas em comparação com as construções da baixa idade média, período seguinte à queda de Roma.

A explicação é simples: a queda de Roma levou consigo um valioso conhecimento sobre construção e o segredo da durabilidade de suas construções se comparadas com as que viriam a seguir. As invasões bárbaras perderam a argamassa e voltaram a construir com tecnologias mais atrasadas, ineficientes e caras. 

Construíram mal, viveram mal e muito pouco restou em pé para as gerações futuras. É como se não tivessem existido.
A engenharia brasileira hoje corre o mesmo risco, pois, com o passar dos anos, a última geração de grandes engenheiros, responsáveis pelas grandes obras do “milagre brasileiro”, está encolhendo – num processo natural de envelhecimento e aposentadoria – sem que haja no horizonte a esperança de reposição destes profissionais. 

Com o Brasil paralisado há 20 anos, toda uma geração de novos engenheiros formou-se para atuar na administração de empresas, no mercado financeiro ou “virar suco” em empreendimentos próprios. Hoje, é patente a “juniorização” dos canteiros de obras e escritórios de projetos, com a dispensa de profissionais com mais de 50 anos de idade por questões de controle de custos. 

É claro que prédios e casas ainda são e serão construídas, novas indústrias instaladas, projetos elaborados, mas a queda em sua qualidade é visível. As patologias das construções são problemas cada vez mais comuns, o desrespeito às normas e metodologias crescentes e a redução nos investimentos com sondagens e inspeções uma constante. 

O maior desafio da engenharia brasileira será reverter este quadro dramático, aproveitando a disposição governamental de realizar os necessários investimentos em infra-estrutura represados há 20 anos, lutando para reinserir no mercado de trabalho os engenheiros experientes, desenvolvendo metodologias de atualização em novas tecnologias para os mais velhos e de capacitação técnica para os mais jovens. Pois a preservação e aquisição de conhecimento técnico são imperativas para o País. 

Este desafio não é um esforço concentrado de uma entidade ou autarquia. É um processo com um objetivo comum, que terá de envolver toda sociedade brasileira, seus profissionais, empresas, escolas e universidades, governos e cidadãos, sem espaço para vaidades e disputas de poder político. 

O Brasil está perdendo valioso conhecimento técnico acumulado durante seu crescimento, conhecimento que nos permitiu criar empresas de engenharia de padrão internacional, que nos diferencia de países vizinhos, que nos colocou entre as grandes nações do mundo. Estamos, por decisão própria, desistindo de ser Romanos para virar um bando de bárbaros. 

* O engenheiro Edemar de Souza Amorim é presidente do Instituto de Engenharia de São Paulo

Autor: Edemar de Souza Amorim