A Crise da madeira tradicional e a oportunidade no bambu: uma reflexão técnica, social e institucional, por Roberto Massaru Watanabe

Na década de 1980, à frente do Laboratório de Construção Civil do IPT — um dos maiores centros de pesquisa de materiais e métodos construtivos do país —, defendi com convicção uma alternativa que parecia lógica diante da escassez progressiva de madeiras nobres como a Peroba Rosa: a substituição por estruturas metálicas. A ideia era converter carpinteiros em serralheiros, promovendo a transição de um saber tradicional para um modelo industrial moderno, baseado em aço e solda.

Hoje, décadas depois, percebo que essa foi uma visão tecnicamente plausível, mas socialmente e culturalmente limitada. Perdemos, nesse movimento, algo essencial: o saber dos carpinteiros, sua habilidade com encaixes, contraventamentos e soluções geométricas sofisticadas, transmitidas oralmente por gerações. Técnicos altamente capacitados foram gradualmente excluídos, e o Brasil abriu mão de uma riqueza profissional que poderia ter sido preservada e renovada.

No exercício atual da coordenação da Divisão Técnica de Projetos de Energia do Instituto de Engenharia — entidade centenária e referência na valorização da engenharia brasileira — e agora também como membro do seu Conselho Deliberativo, reflito com profundidade sobre os rumos que a engenharia nacional precisa adotar. E um desses caminhos passa, inevitavelmente, pela revalorização da madeira como elemento construtivo, não mais restrita às espécies tradicionais esgotadas, mas ampliada por novas possibilidades.

É nesse contexto que surge o bambu como uma alternativa estrutural concreta e promissora. O Brasil possui condições ideais para o cultivo de bambu — rápido crescimento, propriedades físico-mecânicas notáveis, baixa pegada de carbono — mas ainda engatinha na sua industrialização. Precisamos transformar varas e feixes em tábuas, caibros e vigas, utilizando tecnologia e padronização para dar ao bambu a resistência e a durabilidade exigida pela engenharia moderna.

Mais do que isso: o bambu pode ser o elo entre o saber tradicional e a inovação sustentável. Podemos, com planejamento e pesquisa, aproveitar a expertise dos carpinteiros veteranos para formar novas gerações de profissionais especializados em estruturas “de madeira”, só que feitas a partir de um recurso renovável e abundante. Assim, articulamos sustentabilidade ambiental, inclusão produtiva e valorização técnica — três pilares que o Instituto de Engenharia, em suas diversas divisões técnicas, busca integrar em sua atuação institucional.
Se no passado nos faltou uma estratégia para preservar e renovar o uso das madeiras tradicionais, hoje temos a chance de construir um novo paradigma. Diversas universidades, institutos e centros de pesquisa desenvolvem estudos para a utilização do bambu na construção civil. O bambu, industrializado com qualidade e inteligência, pode reocupar o espaço deixado pela Peroba Rosa, não como uma substituição direta, mas como uma evolução alinhada com os desafios do século XXI.

Este é o tipo de reflexão que precisa sair do campo das ideias e entrar nas agendas institucionais. O Instituto de Engenharia está pronto para liderar esse debate, articular parceiros, fomentar pesquisa aplicada e transformar boas ideias em políticas públicas e soluções práticas para o Brasil.

Roberto Massaru Watanabe
Engenheiro Civi
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