Brasil precisa de quase R$ 900 bilhões para cumprir metas no saneamento até 2033, diz pesquisa

Projeção feita pelas operadoras privadas leva em conta investimentos feitos em 2021, após aprovação do marco do saneamento

Nova legislação fecha brecha para que estatais seguissem oferecendo serviços sem licitação em regiões metropolitanas. Foto: Dida Sampaio/Estadão

Números levantados pelas empresas privadas que operam no setor de água e saneamento apontam para o desafio que ainda está pela frente para universalizar o acesso da população brasileira a tratamento de esgoto e água potável. Serão necessários, segundo elas, R$ 893 bilhões até 2033 para cumprir o objetivo fixado na aprovação do marco do saneamento.

A nova legislação, aprovada em 2020, prevê quem daqui a dez anos, a água tratada deverá atender a 99% dos brasileiros e 90% deverão ter acesso à rede de esgoto. Hoje, o serviço de água chega a 84,2% dos moradores, e o esgoto, a 55,8%, segundo dados da Abcon (Associação e Sindicato Nacional das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto), que reúne as 16 maiores operadoras privadas do País.

A projeção feita pela entidade em parceria com a KPMG indica que, se mantido o ritmo de investimentos de 2021, o objetivo da universalização só será alcançado em 2089.

Em 2021, logo após a aprovação do marco do saneamento, foram R$ 18,3 bilhões em investimentos totais no setor, feitos por empresas privadas, estatais e também por Estados, municípios e pelo governo federal. As operadoras do setor privado responderam por cerca de um quinto do total (19,3%).

A média de investimentos também se mexeu pouco logo após a aprovação do marco do saneamento, saindo de R$ 15,3 bilhões no período de 2007 a 2019, para R$ 16,1 bilhões entre 2020 e 2021.

O diretor-executivo da Abcon, Percy Soares Neto, no entanto, avalia que a entrada do setor privado dará velocidade a esses investimentos.

Desde a aprovação do marco do saneamento, ele afirma que R$ 64 bilhões foram contratados em novos investimentos, que deverão se concretizar nos próximos anos. Há 31 projetos de leilões via concessão, privatização e PPPs em elaboração, com previsão de R$ 24,4 bilhões de investimentos.

“As metas não são impossíveis de se cumprir, mas realmente é preciso mudar substancialmente o padrão de investimentos no setor”, afirma Percy. “A partir do valor contratado, nos próximos anos esse indicador tende a melhorar”.

Ele afirma que também os operadores públicos passaram a investir mais, impulsionados pela mexida provocada pelo marco do saneamento. E usa como estimativa o aumento do número de Parcerias Público-Privadas (PPPs) em análise pelo setor público.

“A lei sacudiu o mercado, o público foi retirado da zona de conforto. Alguns partiram para buscar a iniciativa privada, outros começaram a se mexer”, afirma.

Hoje, as PPPs respondem por cerca de 3% dos contratos de prestação de serviços com a iniciativa privada. Com as mudanças promovidas pelo governo Lula, neste ano, a previsão do executivo é a de que elas se transformem no principal vetor de crescimento de investimentos nos próximos anos.

Decretos de Lula

Os decretos presidenciais editados em abril revisando o marco do saneamento, embora alvo de críticas do Congresso, tiveram um ponto de apoio no setor privado: a autorização para que operadores assumissem mais do que 25% de uma PPP. O percentual era o limite para a entrada de um privado no contrato até então.

“As PPPs assumirão certo protagonismo, mas haverá contratos de concessão também. A diferença é que as PPPs, que eram um modelo desincentivado, passam a ser estimuladas agora”, diz Percy.

A revisão dos decretos do saneamento, após costura de acordo político, permitiu que as empresas estatais tivessem mais tempo (até o fim deste ano) e também mais flexibilidade para se adequar às regras. Com isso, muitas delas, condenadas a deixar o mercado, ganharam sobrevida e poderão atuar em conjunto com o setor privado, segundo a previsão do executivo.

“É uma nova fronteira: a companhia pública que foi exposta pelo marco poderá integrar uma PPP para atender a Estados e municípios que não quiseram fazer concessões ou privatizar. Posso exemplificar casos como o de SC, PR, BA, PB e GO. O Paraná, por exemplo, licitou uma PPP no mês passado”, afirma Percy.

Outros importantes mercados estão desenhando concessões e privatizações. Pará e Sergipe estudam concessões, enquanto São Paulo e Minas planejam privatizar o controle de suas empresas estaduais de saneamento.

Nos últimos anos, o Estado do Rio de Janeiro privatizou a Cedae, e o Rio Grande do Sul, a Corsan. Outros Estados e municípios ainda organizam seus modelos de atendimento do serviço.

Fonte: Estadão