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Por Francisco Christovam – Novo transporte público do Brasil precisa sair do papel

(*) Francisco Christovam

Artigo publicado na seção “Tendências/Debates”, no jornal Folha de S. Paulo, edição de 01/02/23.

No novo cenário político, temas cruciais à retomada do crescimento econômico do país e à solução de grandes gargalos em serviços essenciais não podem ser esquecidos. Especialmente quando o assunto diz respeito ao transporte público por ônibus urbano, responsável por 85,7% das viagens de transporte coletivo realizadas no país —um serviço essencial que viabiliza todas as demais atividades econômicas e garante a qualidade de vida nas cidades.

Infelizmente, o transporte público ainda é fonte de insatisfação popular, de queixas da sociedade e de críticas dos formadores de opinião. No entanto, o setor já tem propostas de reestruturação total do serviço. No decorrer de 2022, uma proposta para o novo marco legal do transporte público, caminho para a superação dos desafios históricos do setor, foi elaborada no âmbito do Fórum Consultivo de Mobilidade Urbana, instância ligada ao então Ministério do Desenvolvimento Regional e que reúne especialistas em mobilidade urbana, entidades civis e representantes do poder público. Há também uma proposta de iniciativa do Legislativo, o projeto de lei 3278/2021, de autoria do então senador Antonio Anastasia, que tramita no Senado e segue premissas semelhantes.

As propostas contemplam aspectos necessários à oferta de um transporte público que atenda aos anseios da sociedade, com melhor qualidade do serviço oferecido —uma prioridade do setor para a conquista de mais passageiros para o coletivo urbano. Inclui também questões de ordem jurídico-legal, relacionadas ao modelo de contratação dos serviços, e questões ligadas ao financiamento do transporte público, como a separação da tarifa pública, paga pelo passageiro, da tarifa de remuneração, paga às operadoras pela prestação do serviço —mecanismo que garante a modicidade tarifária e já está previsto na Lei de Mobilidade Urbana (nº 12.587/2012), mas ainda praticado em poucas cidades.

A expectativa de melhoria do transporte público terá que passar ainda pela qualificação desse serviço, por meio da retomada imediata de programas de investimentos na infraestrutura dedicada à mobilidade urbana coletiva. Projetos de priorização do transporte público coletivo por ônibus (sistemas BRT, corredores e faixas exclusivas) têm grande potencial para, no curto e médio prazos, aumentar a velocidade operacional, reduzir custos e tempos de viagens, atrair novos passageiros e, consequentemente, diminuir congestionamentos, acidentes de trânsito e emissão de gases poluentes.

De modo geral, todos aqueles que ofertam esse serviço público essencial aguardam pelo dia em que o Brasil reconheça o transporte coletivo por ônibus como estruturador da mobilidade urbana, a ponto de priorizá-lo nas vias e nos investimentos. É urgente que se reconheça o papel do ônibus e sua importância para a melhoria da mobilidade urbana, assim como a necessidade da integração modal, aumentando a eficiência e evitando a concorrência predatória entre as diferentes opções de deslocamento.

Do lado das empresas, há também a busca pela melhoria da comunicação com os clientes, com a sociedade e com os formadores de opinião. Além disso, será necessário intensificar as iniciativas de capacitação dos órgãos gestores; continuar investindo na governança das empresas; melhorar os serviços por meio de parcerias entre poder público e iniciativa privada; e baratear a tarifa de utilização, por meio de subsídios, para aumentar a demanda e a oferta dos serviços, seguindo as melhores práticas internacionais do segmento.

Caberá aos tomadores de decisões do novo governo federal e do novo Congresso demonstrar compromisso, disponibilidade para o diálogo e boa vontade política para recuperar o transporte público, profundamente afetado pela pandemia de Covid-19, e incluí-lo entre as prioridades na gestão da mobilidade urbana do país. O desafio está posto.

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(*) Francisco Christovam é presidente executivo da Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos – NTU e vice-presidente da Federação das Empresas de Transportes de Passageiros do Estado de São Paulo – FETPESP. É, também, vice-presidente da Associação Nacional de Transportes Públicos – ANTP, bem como membro do Conselho Diretor da Confederação Nacional dos Transportes – CNT e do Conselho Consultivo do Instituto de Engenharia.

*Os artigos publicados com assinatura, não traduzem necessariamente a opinião do Instituto de Engenharia. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo

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