Exercício ilegal de profissão para engenheiros é apenas contravenção penal

Ao desenhar a planta para a reforma da sala do terceiro andar do Edifício Liberdade – um dos três que desabaram no Centro -, ou ao assumir a obra do nono andar, no mesmo prédio, que mudou o banheiro de lugar, a funcionária Cristiane Azevedo e o pedreiro Alexandre da Silva Fonseca podem ter exercido ilegalmente a profissão de engenheiro, mas não cometeram crime algum. Para a legislação brasileira, o exercício ilegal de profissão só é crime no caso de médicos, dentistas e farmacêuticos. Para todas as outras profissões – incluindo aí a engenharia civil -, trata-se apenas de contravenção penal. O artigo 47 do decreto-lei 3.688 de 1941 (que trata de contravenções) prevê para esses casos uma pena de prisão simples, de 15 dias a três meses, ou multa.

Talvez por causa de sua pequena gravidade para a lei, esse tipo de delito seja tão comum: em um ano apenas (de janeiro de 2011 a janeiro passado), o Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Rio (Crea-RJ) notificou 1.948 pessoas e empresas por exercício irregular de profissão, o que levou à emissão de 441 autos de infração. Na Justiça do Rio, no mesmo período, por causa da mesma contravenção, deram entrada 1.462 processos nos juizados especiais criminais. A maioria, no entanto, se referia a outras categorias: foram ações contra falsos taxistas, professores de educação física, servidores públicos e advogados.

– O exercício ilegal de profissão, previsto no artigo 282 do Código Penal, só vale para o caso de médicos, dentistas e farmacêuticos. Para o restante, é mera contravenção – reforça o juiz Murilo Kieling, do III Tribunal do Júri.

Especialista em processo penal, Kieling alerta, no entanto, que, apesar de o exercício ilegal de profissão ser considerado apenas uma contravenção, sua consequência poderá ser um crime grave:

– Se você monta um escritório de arquitetura sem ser arquiteto, isto é uma contravenção. Mas, se isso gerar dano, é outro delito. E pode se agravar muito.

De acordo com o magistrado, o artigo 13 do Código Penal estabelece que o crime é imputado não só a quem o causou pela ação, como também pela omissão:

– Se o falso arquiteto faz a planta e a casa cai, matando alguém, então ele vai responder pela contravenção, mas também por homicídio doloso. Os parágrafos 2 e 3 do artigo 13 estabelecem que a omissão é penalmente relevante quando o omitente (a pessoa que se omite) devia e podia agir para evitar o resultado; quando, de alguma forma, assumiu a responsabilidade de impedir o resultado; ou quando, com seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do resultado.

Autor: Agência O Globo