Professor da Poli-USP aponta razões para o concreto não conforme

Construtoras de São Paulo têm se queixado de receber em suas obras concretos não conformes, ou seja, com resistência abaixo da especificada pelo projeto estrutural. O tema gerou um debate entre construtores, calculistas, laboratórios e concreteiras, que tentam buscar causas e soluções para o problema e delimitar as responsabilidades de cada parte.

A revista Téchne abriu espaço para as discussões sobre o assunto no fórum em seu site e promoveu, em sua sede, em São Paulo, uma mesa-redonda com representantes dos lados envolvidos na questão. O professor e especialista em concreto Paulo Roberto do Lago Helene encaminhou à Redação respostas para as perguntas propostas em nosso site: “Você já teve problemas com peças estruturais de concreto que atingiram resistência abaixo da especificada no projeto? Qual foi a causa constatada?”. Confira na íntegra a explicação do professor e consultor Paulo Helene.

1. Você já teve problemas com peças estruturais de concreto que atingiram resistência abaixo da especificada no projeto?

Resposta: Sim, muitas vezes. Foi preciso proteger, reforçar ou reconstruir.

Desde a década de 60, os especialistas em estruturas, principalmente reunidos ao redor do então CEB (Comité Euro-International du Béton), hoje fib, que deu origem aos Eurocodes, concluiram que a segurança das estruturas (sejam de aço, madeira, alvenaria ou concreto) deve ser tratada de uma maneira probabilista.

As variáveis são aleatórias, independentes, interdependentes, e são tantas que praticamente, salvo casos muito específicos, é impossível haver uma certeza absoluta da segurança.

Essa visão moderna para a época conseguiu ser disseminada no meio técnico, e em 1972 o CEB lançou seu Model Code com base estocástica e revolucionária para a época.

O concreto e seus apaixonados e competentes adeptos foram os pioneiros em todas as áreas de segurança de estruturas a introduzir esses novos, verdadeiros e irrefutáveis conceitos. No Brasil esses conceitos – introduzidos principalmente pelos Prof. Fusco, Prof. Laranjeiras e Prof. Décio de Zagottis, entre outros luminares – culminaram no novo e moderno texto da NBR6118:1978. O texto da NBR6118:2003 mantém os mesmos conceitos daquela época.

Nessa conceituação de introdução da segurança no projeto estrutural, admite-se que a resistência do concreto e das armaduras são variáveis aleatórias que podem ser muito bem representadas por uma distribuição normal ou de Gauss. Esse fato já tinha sido demonstrado nos primeiros estudos de probabilidade no Brasil através dos trabalhos pioneiros de Paulo Sá, no Rio de Janeiro na década de 1930.

Assim sendo sempre haverá um valor médio, um certo coeficiente de variação e uma certa variabilidade ou coeficiente de variação que é a razão entre desvio padrão e média, em porcentagem.

Como seria impossível desejar um valor mínimo, convencionou-se adotar um valor característico correspondente ao quantil de 5% inferior. Assim sendo 95% da resistência do concreto e da armadura devem estar acima do valor especificado no Projeto.

Porém, como é óbvio, 5% podem estar abaixo. Essa é a regra, esse é o processo de construção de uma estrutura de concreto armado ou protendido. No caso de pavimentos de concreto esse quantil inferior é muito maior, é de 20%. Pura convenção acordada consensual e internacionalmente, e consolidada nos textos normativos e nos contratos comerciais.

Portanto toda obra de concreto e de aço pode ter até 5% das resistências abaixo do valor especificado no Projeto estrutural. Esse fato é inerente ao ato de Projetar e Construir estruturas de madeira, de aço ou de concreto ou de alvenaria.

Portanto, no caso de estruturas de concreto, interessa saber onde foi esse concreto ou aço indesejado mas que faz parte do “acordo” internacional. Ou seja, o fornecimento está conforme, porém e infelizmente, precisamos saber onde foram esses materiais de resistência abaixo da especificada.

Há necessidade de saber por razões de segurança e não por razões de conformidade de fornecimento. Somente seria não conforme aquele fornecimento de concreto e de aço onde mais de 5% do total entregue apresente resistência abaixo da especificada no Projeto Estrutural.

2. Qual foi a causa constatada?

Resposta:
1. Falta de armadura por erro de projeto;
2. Falta de armadura por posicionamento errado da armadura durante a (má) execução;
3. Falta de estribos em pilares principalmente em uniões e traspasses;
4. Bicheiras e ninhos de concretagem devido à má execução;
5. Resistência da armadura abaixo da especificada;
6. Erro de posicionamento das armaduras no projeto estrutural;
7. Erro de formas (tolerâncias e escoramento deficiente);
8. Resistência do concreto abaixo da especificada;
9. Resistência do concreto especificada no Projeto abaixo do recomendado por norma;
10. Cobrimento da armadura inferior ao recomendado por norma;
11. Corrosão de armaduras e redução da seção de aço;
12. Reação álcali-agregado.”

Autor: PINIWeb