Mesmo com crise, lista de concessões para 2009 alcança R$ 75 bi

Apesar da crise financeira, o governo mantém planos de leiloar em 2009 projetos de infra-estrutura com investimentos de pelo menos R$ 75 bilhões em recursos privados. São concessões de usinas hidrelétricas, linhas de transmissão, rodovias, ferrovias e portos que deverão ser licitados até dezembro. 

A justificativa das autoridades federais para seguir adiante com o cronograma planejado é que os projetos, além de funcionar no curto prazo como medida anticíclica para combater a desaceleração da economia brasileira, são essenciais para evitar futuros “apagões” de infra-estrutura e sustentar a retomada do crescimento mais vigoroso. 

As concessões englobam investimentos de US$ 11 bilhões no Trem de Alta Velocidade (TAV), entre Rio e São Paulo, cujo edital é prometido para maio. Os estudos de demanda e o traçado básico serão apresentados em janeiro ao Ministério dos Transportes. Há perspectivas ainda de entregar à iniciativa privada um novo trecho da Norte-Sul, entre Palmas (TO) e Estrela DOeste (SP), e a construção da Leste-Oeste, na Bahia. São projetos que, juntos, totalizam mais de R$ 11 bilhões. 

O presidente da Associação Brasileira da Infra-Estrutura e Indústrias de Base (Abdib), Paulo Godoy, diz que o sucesso dos leilões de 2009 está muito atrelado à velocidade de recuperação do crédito para as empresas. O sistema de garantias aos financiamentos se sustenta no rating corporativo, na fiança bancária e nos seguros. 

Nas três frentes, as dificuldades ainda são grandes e ameaçam a disposição do setor privado para participar de novas licitações, nota Godoy. Segundo ele, os contratos em execução somam atualmente R$ 220 bilhões – R$ 120 bilhões em petróleo e gás e outros R$ 100 bilhões em estradas, portos e hidrelétricas. 

Muitos ainda não têm financiamento de longo prazo garantido. O presidente da Abdib elogia as medidas tomadas até agora pelo governo, mas alerta que em breve “o cobertor pode ficar curto”. Se não houver sinais claros de reativação ao longo de 2009, é melhor adiar algumas concessões do que licitá-las em um cenário de escassez de crédito, cogita Godoy. 

Nesse contexto, ele sugere ao governo selecionar suas prioridades, deixando projetos menos urgentes para outro momento. “Energia é um campo sensível. Não podemos bobear.” 

A primeira licitação do ano deve ocorrer em 21 de janeiro, mas o cronograma está sujeito a pequenas mudanças. Será a disputa pela administração de 680 quilômetros da BR-116 e da BR-324, na Bahia. Em abril, o governo deverá inaugurar a terceira etapa das concessões de rodovias, com trechos de 2.066 quilômetros na BR-116 e na BR-381, em Minas Gerais, além da BR-040 (Brasília-Juiz de Fora). Os investimentos ao longo do período de concessão, somando todas as rodovias, são de R$ 10,2 bilhões. 

O diretor-geral da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), Bernardo Figueiredo, adianta que a terceira etapa introduzirá um novo conceito nas concessões rodoviárias. Em vez de definir um cronograma fixo de investimentos, o ritmo dos desembolsos obedecerá ao crescimento do fluxo de veículos. “Vamos olhar o nível de serviço das rodovias.” 

Figueiredo diz que o BNDES está preparado para financiar as novas concessionárias e não faltará crédito. De acordo com ele, mesmo se não houver deságios expressivos, a fixação da tarifa máxima de pedágio deverá assegurar preços relativamente módicos. “Estamos fazendo estudos com margens mais estreitas”, afirma o diretor, referindo-se às projeções do fluxo de veículos nas estradas e da taxa de retorno que viabilizará o investimento. 

Nos leilões anteriores, como o das rodovias Fernão Dias e Régis Bittencourt, “apostávamos que o mercado ia ajustar as eventuais falhas dos estudos para patamares mais adequados”. A OHL, por exemplo, conseguiu oferecer deságios superiores a 50% aumentando a estimativa do fluxo de veículos nas estradas. “Mesmo com a crise, temos informações de que as estimativas da OHL estavam muito mais próximas da realidade do que aquilo que os estudos (oficiais) haviam projetado”, diz Figueiredo. 

Para ele, as concessões são atrativas. “Não é uma conjuntura adversa que atrapalha as perspectivas de retorno no longo prazo. Acho que os investidores vêem dessa forma.” 

No setor elétrico, a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) prevê leilões de obras que vão exigir investimentos de até R$ 28 bilhões ao longo do período de concessão. A grande vedete é a usina hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu (PA), com potência instalada de 11.181 megawatts (MW) e licitação prevista para outubro. 

Depois das usinas do rio Madeira, Belo Monte é o grande projeto do governo para assegurar o abastecimento de energia na próxima década. A hidrelétrica deverá entrar em operação em 2014 e custará cerca de R$ 7 bilhões. 

“Com ou sem crise, haverá interessados”, acredita o presidente da EPE, Maurício Tolmasquim. Ele admite que a conjuntura econômica pode até reduzir o número de concorrentes e as perspectivas de grandes deságios, mas alerta: se não houver imprevistos no licenciamento ambiental, o governo não atrasará o leilão “de jeito nenhum”. 

“É um projeto para 2014. Empresas como Vale e CSN podem estar dando uma paradinha agora, mas têm planos otimistas para o longo prazo”, diz Mário Menel, presidente da Abiape, associação que reúne indústrias que investem na geração de energia elétrica para consumo próprio. 

Na área de geração, a EPE espera leiloar em 2009 outras quatro hidrelétricas: Cambuci (RJ), Barra do Pomba (RJ), Garibaldi (SC) e Juruena (MT). Juntas, elas totalizam 326 MW e devem ajudar o governo a colocar um freio na piora da matriz elétrica. Recentemente, as térmicas a óleo – mais caras e poluentes – têm predominado nos leilões de energia. 

Outros projetos, como um conjunto de hidrelétricas no rio Parnaíba (PI), poderá reforçar a lista em 2009 ou 2010 caso haja avanços no processo de licenciamento. Na área de transmissão, apenas o primeiro semestre terá licitações das linhas Banabuiú (CE)-Mossoró (RN), Eunápolis-Teixeira de Freitas II (BA) e Foz do Iguaçu-Cascavel (PR). Essa última dará uma nova alternativa de escoamento da energia de Itaipu.
Tolmasquim afirma que o governo tomará todas as medidas necessárias para assegurar os investimentos. Um exemplo é o recém-criado Fundo de Garantia a Empreendimentos de Energia Elétrica (FGEE), formado por títulos da dívida pública federal, ações de empresas estatais e dinheiro da União. 

“Uma das estratégias para combater a crise é justamente potencializar os investimentos em infra-estrutura”, diz. 

O governo também promete inaugurar em 2009 as concessões de portos e aeroportos à iniciativa privada. No segundo semestre, planeja licitar terminais privados em Manaus e no sul da Bahia. Até o fim de junho, o modelo de concessão de aeroportos ficará pronto, abrindo o caminho para o lançamento dos editais de leilão do Galeão e de Viracopos nos meses seguintes. Nesses casos, entretanto, ainda não há estimativa dos investimentos.

Autor: Valor Econômico